sábado, 13 de março de 2010

“A pedagogia do professor-educador”

No inicio de minha carreira educacional, ainda cursando a Licenciatura de Matemática, tive muitas dificuldades na compreensão e assimilação desta (até então) nova proposta de ensino. Em diversos momentos, cheguei a considerar a possibilidade de fazer uma mudança radical em meus planos e objetivos. Pensei diversas vezes em seguir por outro caminho... Por diversas vezes, pensei em desistir do sonho de ser um professor de matemática. Mas apesar das inúmeras dificuldades iniciais que vivenciei, aos poucos, fui me adaptando ao sistema. Hoje, posso dizer de maneira bem segura, que tenho uma renovada e muito melhor concepção em relação às novas metodologias e responsabilidades de todo professor.

Um dos pontos iniciais, que produziu maior insatisfação a mim (no inicio do curso), sem dúvida alguma, diz respeito ao conteúdo de Formação Pedagógica por considerá-la naquele momento desnecessária e um tanto quanto monótona. Meu instinto matemático estava ansioso por Cálculo, seus limites, derivadas e integrais... Tanto que naquele momento, quando tivemos a possibilidade de analisar algumas teorias pedagógicas, como as ‘Morin’, princípio, não lhes dediquei á devida atenção, por considera-las desnecessárias e altamente utópicas. Mas com algum tempo, algo foi se tornando diferente, algo mudou e assim, comecei a enxergar, “ver” de maneira clara, o quão importantes seriam estas teorias na minha formação, não apenas como um simples elemento de transferência de teoria matemática, mas sim, enquanto “professor-educador”.

Há algum atrás, aconteceu algo bastante inusitado. Ao assistir o filme, “O Grande Ditador” de Charles Chaplin (década de 40), vi ao seu fim um discurso de encerramento que despertou bastante á minha atenção. Eis um fragmento: "... A máquina, que produz abundância, tem-nos deixado em penúria. Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco. Mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido...”(discurso final do filme O Grande Ditador).

É notório que a intenção do autor, é fazer uma crítica ao momento político que assolava a população mundial ao final da década de trinta e inicio da década de quarenta (a 2º Guerra Mundial). Mas por que este trecho chamou-me a atenção e em que sentido isso ocorreu? Aí entra o porquê de ser inusitado, pois me fez recordar algo que havia visto durante o primeiro ano de curso na universidade. Em “Os Sete Saberes Necessários á Educação do Futuro”, Edgar Morin defende que a educação do futuro deve concentrar, primordialmente, o ensino na condição humana, na concepção do ser como animal e como humano num conjunto de ações e reações.

Para Morin, o bom funcionamento das sociedades, depende de uma educação que, (por ser um fenômeno sócio cultural e universal) cuide da formação de seus indivíduos em suas capacidades físicas e espirituais, preparando-os através do conhecimento e de experiências culturais e cientificas, tornando-as os aptos á vivência digna neste mundo globalizado.

Assim, (re)comecei a analisar e à comparar estes dois posicionamentos, e percebi que apesar de aparentemente se referirem a situações diferentes, em sua essência, apresentam de forma implícita, a idéia de que não basta apenas o conhecimento teórico para a formação do ser, mas também a sua preparação cultural, espiritual, cientifica e sobretudo, a sua real formação “humana”. Mas para que esta “formação humana” seja possível se faz necessário também uma nova concepção na “formação do educador”.

Isto também me fez lembrar quando ainda no primeiro ano, tive a oportunidade de analisar e debater com meus saudosos colegas e mestres, os ideais de Rubens Alves, em seu livro: “Conversas com quem gosta de ensinar”. Nele, Rubens Alves traz uma interessante analogia em relação a esta questão de professores e educadores.

"... Pode ser que educadores sejam confundidos com professores, da mesma forma como se pode dizer: jequitibá e eucalipto, não é tudo árvore, madeira? No, final, não dá tudo no mesmo?...” (Rubens Alves, 2000).

Ora, apesar de muitos consideraram estes termos sinônimos, como naquele momento eu também considerava, hoje está claro para mim e acredito que, para muitos outros também, que estes representam situações distintas, pois ser professor é simplesmente possuir uma profissão cuja única finalidade é a sua satisfação pessoal e institucional, sem se importar com o que isto acarreta no ser enquanto seu aluno. Já em relação ao educador, percebe-se uma postura diferenciada, onde em nome de uma vocação, do amor e da esperança de contribuição para a formação de seres mais justos e capacitados, estabelece-se então, uma relação consistente para com os alunos, aceitando que estes também possuem emoções diversas, possui uma bagagem própria, uma cultura individual, as quais devem ser respeitadas. Em síntese, o professor é o “eucalipto” e o educador é o “jequitibá”,

"... Há arvores que têm uma personalidade, e os antigos acreditavam mesmo que possuíam uma alma. É aquela árvore, diferente de todas, que sentiu coisas que ninguém mais sentiu. Há outras que são absolutamente idênticas umas as outras, que podem ser substituídas com rapidez e sem problemas. Eu diria que os educadores são como as velhas árvores. Possuem uma face, um nome, uma “historia” a ser contada..."

Agora percebo que durante um bom tempo me portei como um “eucalipto” era como uma árvore comum em meio de outras tantas, onde não me importava com a formação humana do ser, do aluno, subjulgando-me aos interesses do sistema. No entanto, hoje considero a condição de educador, essencial para a formação educacional do futuro, valorizando a interiorização do ser, seus sentimentos e principalmente, a expansão dos horizontes utópicos, que tanto me degradavam inicialmente.

Junto a esta nova postura educacional, também considero de extrema importância que o professor aprofunde seus conhecimentos, se possível, acima do que será ensinado, deixando-o em condições de realizar um trabalho eficiente e coerente. Ao mesmo tempo, demonstrar aos alunos interesse e entusiasmo pelo conteúdo. Deve aprofundar horizontes, conhecimento.

Uma maneira que creio ser adequada para que se coloque em prática, na busca por um melhor aprendizado e entendimento de nossos alunos do conteúdo matemático, é uma abordagem mais ampla e interdisciplinar dos temas matemáticos. Devemos mostrar aos nossos alunos, o quanto a matemática esta presente em nossa vida, o quanto ela é necessária para a sua vida e da sociedade em geral, nas mais diversas áreas da humanidade. Temos e devemos mostrar e demonstrar aos nossos alunos aplicações interessantes e relacionadas aos temas a serem abordados, ou seja, investigá-los e integrá-los a uma contextualização da matemática com as demais áreas de estudos, a cultura em geral e o mais importante: a sua própia cultura, a sua vida.

Contudo, estou ciente de que, isto não é um processo fácil de ser colocado em prática, pois são muitas as dificuldades que nós professores encontramos em nosso dia-a-dia, mas devemos sim, por mais árduos e espinhosos que sejam os caminhos da educação, buscarmos intensa e incessantemente essa “transformação”. Acredito que esta deva ser a nova concepção que nós professores, principalmente relacionados à Matemática, mãe de todas as ciências, devemos ter para com o nosso dever atual, de não apesar repassar conteúdos, mas sim, de sermos professores-educadores, formadores de seres virtuosos, capazes e humanos afim de que nada se perca...


Professor João Gilberto
09 de março de 2010

Um comentário:

  1. Adorei o seu texto. O mundo hoje realmente precisa cada vez mais de educadores jequitibá. Continue sendo sempre um educador Jequitibá.Parabéns pelo seu brilhante trabalho.
    Luciana

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